FICÇÕES ONÍRICAS N. 4
Por PAULO VICTOR ALBERTONI LISBOA com arte de MARCIA CYMBALISTA
UMA FORTE VENTANIA INSTALOU OS PONTEIROS NUMA ÁRVORE. Aves de todas as cores voavam na direção da casa e protestavam contra aquela algazarra que partiu dali para se pendurar na casca da árvore. E nada podiam escutar de dentro da casa.
Falavam em todas as línguas de aves e não podiam decidir se os ponteiros ficariam ali, instalados na árvore. Resolveram chamar o Japim.
Com uma corte, as aves se empoleiraram nos ponteiros. As aves falavam, o Japim traduzia. Árvores não têm ponteiro. Como não, se elas conhecem bem o tempo? As aves não têm ponteiro. Como não, se elas conhecem bem o tempo?
Então, as aves começaram a gostar dos tempos e encontraram aquele tempo estranho ao tempo das estações, as horas, os minutos e os segundos, também o tempo das estações. E se depararam com uma origem de um tempo, a marcação de um tempo, afinal, a que horas começa a girar a hora, a que horas começa a girar o minuto, a que horas começa a girar o segundo, a que minuto gira a hora, a que segundo o minuto gira a hora, a que segundo a hora começa a girar minuto, que horas eram, que horas serão, a que hora foi, a que hora chegaram os ponteiros na árvore?
Às oito horas de uma manhã de verão, disse um Bem-te-vi.
Às zero horas de uma noite de outono, disse um Urutau.
Às dez horas da manhã de uma primavera. Não. Às três da tarde de uma primavera, disse um Beija-flor.
Às doze horas, o meio-dia de um verão qualquer, disse o Urubu.
Às treze horas de uma tarde de inverno, disse um Tesourinha.
O Japim olhou para os ponteiros empoleirados pelas aves e disse que já havia passado uma hora. Então, as aves voaram e puxaram um ponteiro. Assim, começou o tempo na urgência daquela assembleia de aves.
A algazarra voltou a fazer sentido, e fazia um sentido horário. Foi então que a casa começou a entrar em parafuso. Penas de todas as cores saltavam do seu interior, até que uma ave metálica se esticou pela janela e, com uma caixa de papelão de baixo das asas, lançou voos rasantes pelo quintal, voos circundantes no território da árvore, da casa, das aves. E o tempo vinha porque as aves tinham pressa para concluir a assembleia. As aves se empoleiravam nos ponteiros para acelerar o tempo, mas as estações eram difíceis de desestacionar.
Enquanto a ave metálica alçava voos, de repente deixou cair a caixa no alto da árvore. As aves voaram correndo para ver aquela caixa. Japim, Japim, o que a ave metálica escreveu aqui? O Japim leu na língua escrita das aves metálicas: itens de relojoaria.
Só assim a ave metálica fez de aero-ponto o ponteiro da hora e desceu o voo. O Japim reuniu as aves, incluindo a ave metálica e perguntou: a que ponteiro chegamos?
No desfazer-se da corte, as aves convocaram a Araponga, a Carapina e o Pica-pau para o trabalho de ferreiro e de marceneiro, destacaram os ponteiros com a casca da árvore, devolvendo à caixa da ave metálica um relógio de madeira.
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