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Paulo Victor Albertoni Lisboa

Notas sobre os autismos

Nem sempre o termo “autista” ou “autismo” esteve relacionado ao campo das patologias, e, além do mais, sua história está repleta de misturas e confusões com as psicoses e a esquizofrenia.

Ao que tudo indica, Eugen Bleuler utilizou o termo, em 1911, no escrito intitulado "Dementia Praecox ou o grupo das esquizofrenias" com o intuito de descrever sintomas da esquizofrenia.

Na década de 30, Melanie Klein utilizou o termo para se referir a um estágio do desenvolvimento no qual a criança se retiraria do mundo exterior e se concentraria, então, no mundo interior, suas fantasias, seus pensamentos, etapa fundamental para o seu desenvolvimento.

Corrijam-me se eu estiver enganado, mas foi apenas na década de 40 foi atribuída ao autismo existência autônoma no campo das patologias, por meio dos escritos do psiquiatra Leo Kanner. Uma longa polêmica marcou o início dessa relação com as patologias, destacando-se, no interior dessa polêmica, as hipóteses acerca da origem ou da causalidade do autismo (inato, genético, ambiental, cultural, etc.) e dos caminhos clínicos.

Michael Balint, Donald Winnicott e Jean Piaget fizeram contribuições significativas em diálogo com a pediatria e a psicologia. Entre as décadas de 50 e 70, as investigações se dividiram a partir de diferentes ênfases analíticas e experiências clínicas.

A retomada da centralidade dos estudos de linguagem, então, renovados em diálogo com as recentes invenções dos estudos linguísticos, permitiu o retorno a temas clássicos da psicanálise, a exemplo dos estudos de Sigmund Freud sobre a afasia (1891), os chamados “distúrbios de linguagem” e a ocorrência de lesões orgânicas, ainda distantes das hipóteses linguísticas para as investigações do autismo, porém, com invenções relevantes para hipóteses futuras.

A identificação de estruturas clínicas nos estudos de Jacques Lacan reorganizou uma parte dessas investigações, com desdobramentos muito recentes e relevantes. É possível dizer que as estruturas clínicas (neurose, psicose e perversão) indicam, sobretudo, diferentes modos de subjetivação, da constituição do sujeito na sua relação com a linguagem.

Mais recentemente, em alguns estudos, tais como os de Jean-Claude Maleval, o autismo é repensado na sua singularidade e se chega à formulação de uma outra estrutura clínica, uma quarta estrutura (ou seja, além da neurose, da psicose e da perversão, a do autismo). Essa reorientação é fundamental por várias razões, uma delas é que retira os autismos de uma confusão terminológica muito difundida, presente em manuais pouco polifônicos.  Diante dessa reorientação - também clínica -, importa, então, a relação autística do sujeito com a linguagem, os caminhos singulares de sua subjetivação.

Assim, os autismos são reposicionados na experiência investigativa se comparada a situação atual àquela inicial, quando estiveram enquadrados na sintomatologia esquizo ou na linha única da métrica dos estágios.

Aos analistas e às analistas, vale dizer que esta não é/não será uma discussão somente terminológica. A discussão impacta, por assim dizer, a sua própria análise e/ou supervisão, abrindo perguntas sobre seu funcionamento autístico com a linguagem, os mundos autísticos que habitaram ou habitarão criativamente porque as estruturas clínicas tem a ver com modos mais ou menos dinâmicos do sujeito se relacionar com a linguagem e a crônica da vida cotidiana.




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