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NÃO SEI SE FOI SORTE OU GENTILEZA

  • Foto do escritor: Paulo Victor Albertoni Lisboa
    Paulo Victor Albertoni Lisboa
  • 4 de mar. de 2022
  • 2 min de leitura

Por PAULO VICTOR ALBERTONI LISBOA com arte de PAULO D’ALESSANDRO


ERA UMA SEXTA-FEIRA LOTADA, daquelas de ir ao ponto de ônibus no final da tarde e ouvir: vai pegar engarrafamento. Tomei o ônibus mais próximo e fui demorar a descer lá no primeiro terminal. Cheguei na hora certa e o ônibus já havia saído.

Começou a chover trinta minutos de atraso com ventos fortes e eu estava sem um guarda-chuva. Embarquei no ônibus da hora do embarque seguinte. O ônibus saiu cheio. E a cada ponto descia um, dois, subia quatro ou seis passageiros.

Era só uma sexta-feira demorada. Bala, balinha, capinha de celular, oração bíblica, água. Alguém pedindo para passar o cartão de passagens porque o seu cartão havia “zerado”. Uma hora e meia de viagem.

Antes do terminal de desembarque obrigatório, a minha parada era o último ponto de ônibus. Puxei a cordinha, apertei o botão, um pouco apressado. Trânsito parado.

Paramos antes do ponto de ônibus. Procurei o cobrador e pedi pra deixarem eu descer ali mesmo na correria. O motorista abriu as portas e descemos uns três. Cada um numa direção diferente, passos ligeiros e ninguém com guarda-chuva.

Quando cheguei ao meu destino, um imprevisto já havia cancelado o evento. Conversei um pouco, reclamei bastante. De repente, eu me dei conta de que poderia perder o giro do ônibus no terminal.

Estava chovendo ainda. Desci o prédio pelas escadas, saltando sempre os últimos degraus, com muita pressa. Um, dois, três saltos atléticos. Disparei no térreo. Comecei a correr lá fora para chegar à rua, atravessá-la ligeiramente em um ambiente de trânsito intensificado – naquela altura não havia semáforos, era uma daquelas ruas em que é preciso manejar o trânsito.

Eu avistei o ônibus descendo a rua na direção do ponto de ônibus e se afundando no horizonte. Corri ainda mais depressa. Quando o ônibus já despontava na subida em direção ao ponto de ônibus, eu sinalizei ao motorista como se ele pudesse compreender a mensagem:

peloamordedeusmeesperemotorista!

Tamanha velocidade do ônibus e o pé pesado do piloto, desacreditei e comecei a pisar discreto quando ele passou por mim. Do outro lado da rua, andando na direção do ponto de ônibus, uma senhora acenou ao motorista, fazendo pouco caso de que ele parasse. O ônibus parou e aguardou os seus passos lentos.

Como eu ainda não havia atravessado a rua, voltei a acelerar o passo e a ameaçar atravessar inadvertidamente o fluxo dos veículos. Um motorista acolheu os sinais da correria e acudiu o passo. Eu atravessei a rua sob uma chuva ainda mais intensa.

Como quem pisa uma esponja retardante de passos apressados, fui pisando fofo até chegar ao ônibus. No momento em que pisei o primeiro degrau, escutei a senhora falando com o motorista: puxa, que pena, eu me enganei. Enquanto eu procurava o cartão, olhei para trás e intuí algo esquisito na atuação daquela senhora. Ela desceu com o seu guarda-chuva. Com o ônibus em movimento, acomodado no meu lugar, resolvi então me apoiar no vidro da janela e olhar para trás. Lá estava ela atravessando a rua obstinadamente, com o seu guarda-chuva fechado.


Continua:

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